A Igreja, como corpo de Cristo, é um dos pilares da fé cristã, mas há uma tensão constante entre o que imaginamos que ela deveria ser — a Igreja ideal — e o que ela é de fato — a Igreja real. Enquanto a primeira reflete nossos anseios por perfeição, unidade e santidade absoluta, a segunda carrega as marcas da humanidade: falhas, conflitos e limitações. Reconhecer essas diferenças é essencial para evitar ilusões que, como adverte a sabedoria popular, podem levar à perda do ideal e à destruição do real. Baseando-nos na Bíblia, podemos compreender por que não devemos nos iludir com expectativas falsas e como viver a fé de forma prática e madura.
As Diferenças Fundamentais
A Igreja ideal é uma visão utópica: um lugar onde todos vivem em perfeita harmonia, o amor reina sem interrupções e a presença de Deus é palpável em cada detalhe. É o retrato glorioso de Apocalipse 21:2-4, onde a "nova Jerusalém" desce do céu, sem lágrimas, morte ou dor. Já a Igreja real é o que vemos hoje: uma comunidade de pecadores redimidos, mas ainda em processo de santificação. Em Atos 15, por exemplo, os primeiros cristãos enfrentaram disputas sobre a circuncisão, mostrando que, mesmo na Igreja primitiva, havia discordâncias e imperfeições. A ideal é imaculada; a real é marcada por lutas, como Paulo descreve em 1 Coríntios 1:10-11, ao repreender divisões entre os irmãos.
Outra diferença está na percepção de seus membros. Na Igreja ideal, todos são plenamente santos, sábios e altruístas. Na Igreja real, encontramos hipocrisia, fraquezas e até pecados graves, como o caso de Ananias e Safira (Atos 5:1-11), que mentiram ao Espírito Santo. A ideal existe como um sonho escatológico; a real opera no "já e ainda não" do Reino de Deus — presente, mas incompleta até a volta de Cristo.
O Perigo das Expectativas Falsas
Iludir-se com a Igreja ideal é perigoso porque ignora a realidade humana e a soberania de Deus no processo de redenção. Quando projetamos expectativas irreais, como uma comunidade sem falhas ou líderes infalíveis, abrimos espaço para a desilusão. Em Mateus 13:24-30, na parábola do joio e do trigo, Jesus ensina que o Reino (e, por extensão, a Igreja) terá justos e injustos convivendo até o fim dos tempos. Querer arrancar o joio agora — ou abandonar a Igreja por suas imperfeições — é rejeitar o plano divino de paciência e crescimento.Além disso, falsas expectativas podem nos tornar juízes em vez de irmãos. Em Romanos 14:10-13, Paulo alerta: "Por que você julga seu irmão? [...] Deixemos de julgar uns aos outros." Quem sonha com a Igreja ideal muitas vezes se frustra com os erros alheios, esquecendo que todos somos "vasos de barro" (2 Coríntios 4:7), frágeis, mas portadores do tesouro da graça. Essa frustração pode levar ao abandono da comunhão, contrariando Hebreus 10:24-25, que nos exorta a não deixar de nos reunir, mas a encorajar uns aos outros.
A Solução: Abraçar a Igreja Real com Esperança
Não se iludir não significa desistir da Igreja, mas aceitá-la como ela é: imperfeita, porém redimida. Em Efésios 5:25-27, Paulo diz que Cristo amou a Igreja e se entregou por ela para santificá-la, prometendo apresentá-la gloriosa no futuro. Isso nos ensina que a santidade da Igreja é um processo, não um estado imediato. Nossa tarefa é participar desse processo com humildade e amor, como Pedro recomenda em 1 Pedro 4:8: "Acima de tudo, amem-se profundamente, porque o amor cobre uma multidão de pecados."
A Igreja real, com suas falhas, é o campo de treinamento da fé. É onde aprendemos a perdoar, como Cristo nos perdoou (Colossenses 3:13), e a suportar uns aos outros em amor (Efésios 4:2). Esperar a perfeição agora é perder de vista que Deus escolheu usar o que é fraco para confundir o forte (1 Coríntios 1:27). Assim, em vez de destruir a Igreja real por não ser ideal, devemos edificá-la, confiando que o Espírito Santo a está moldando para o dia final.
Conclusão
A Igreja ideal é um vislumbre do futuro, um destino que nos inspira. A Igreja real é o presente, um caminho que nos desafia. As diferenças entre elas — perfeição versus imperfeição, sonho versus realidade — não devem nos levar à ilusão ou ao desespero, mas à maturidade espiritual. Como ensina a Palavra, "agora vemos como em espelho, embaçado, mas então veremos face a face" (1 Coríntios 13:12). Enquanto o "então" não chega, nosso chamado é amar e servir a Igreja real, sem nos perdermos em falsas expectativas, mas firmados na esperança de que Deus a está aperfeiçoando para Sua glória.
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